O exame OCT de segmento anterior: aplicações atuais na oftalmologia

Para Oftalmologistas

O exame OCT (sigla em inglês para Tomografia de Coerência Óptica) foi criado em 1991, de forma análoga ao ultrassom, ao gerar imagens transversais in vivo de tecidos, utilizando ondas de luz para obter o perfil de refletividade das estruturas em investigação. O exame OCT de segmento anterior (SA-OCT) utiliza comprimento de onda de 1310 nm, uma vez que isto permite uma maior penetração em estruturas oculares dispersoras de luz, como esclera e íris, resultando em uma morfologia mais detalhada das estruturas do ângulo da câmara anterior.

Após a aquisição, as imagens obtidas pelo SA-OCT devem ser processadas através de um software personalizado. Esse software de processamento de imagem compensa a transição dos índices de refração, tanto da interface ar-lágrima, quanto dos diferentes índices de grupo no ar, córnea e humor aquoso, para que as dimensões físicas das imagens sejam corrigidas.

O SA-OCT é um dispositivo que está cada vez mais sendo utilizado para avaliação de pacientes glaucomatosos e com patologias corneanas, utilizando uma técnica quantitativa, não invasiva e de não contato, permitindo uma medição rápida de vários parâmetros do segmento anterior.

A interpretação qualitativa e quantitativa do ângulo da câmara anterior depende da determinação da localização do esporão escleral, observado na parte mais larga da esclera e aparecendo como uma protusão escleral em direção à câmara anterior, que serve como ponto de inserção de algumas das fibras do feixe longitudinal do músculo ciliar. É um marco anatômico para localizarmos a malha trabecular, situada 250-500 μm acima do esporão escleral ao longo da parede do ângulo cameral.

Camara anterior e angulo iridocorneano observados pelo OCT de segmento anterior - O exame OCT de segmento anterior: aplicações atuais na oftalmologia

Figura 1. Ângulo da câmara anterior de paciente mulher, 57 anos. Na imagem superior, podem ser observados esclera, esporão escleral, malha trabecular e íris (formato côncavo). Na imagem inferior, temos a região do globo ocular que foi examinada. (créditos: Wies6014, Own work, Wikimedia commons).

Em pacientes com glaucoma, especialmente aqueles com glaucoma de ângulo fechado, a avaliação do ângulo pelo SA-OCT tem ajudado cada vez mais o oftalmologista em suas avaliações quantitativas. A gonioscopia permanece sendo o padrão-ouro para diagnóstico de ângulos estreitos, no entanto, este método apresenta algumas limitações. A gonioscopia é um exame clínico subjetivo, médico-dependente, muito relacionado com a habilidade, experiência e interpretação do examinador. Por exemplo, um ângulo fechado ou estreito pode erroneamente parecer aberto se for feita indentação corneana inadvertida, isto é, caso o examinador exerça muita pressão sobre o olho do paciente de maneira não intencional.

Exame OCT: novidades

Com o advento do SA-OCT, uma nova ferramenta propedêutica está à disposição dos oftalmologistas para melhor avaliação dos pacientes, somando-se ao exame clínico e proporcionando melhor acurácia diagnóstica. Através do SA-OCT, importantes parâmetros da câmara anterior podem ser medidos e estudados, como largura, área e volume, e da íris como espessura, curvatura e área, apresentando consistente associação com a largura do ângulo iridocorneano.

Outro parâmetro interessante é o abaulamento ou elevação do cristalino, que é uma medida do quanto a superfície anterior do cristalino está localizada anteriormente ao esporão escleral. Estudos recentes têm sugerido que tanto o abaulamento do cristalino quanto a curvatura da íris estão associados, independentemente, com o fechamento angular. Entretanto, é importante observar que nenhum destes parâmetros deve determinar isoladamente as decisões do manejo clínico, pois o fechamento angular resulta da combinação de várias características anatômicas de cada olho.

Com a evolução tecnológica do exame OCT de segmento anterior, a resolução das imagens obtidas têm melhorado muito, permitindo a identificação de uma importante referência anatômica: a linha de Schwalbe. Esta estrutura pode ser observada em mais de 90% das imagens adquiridas por meio das tecnologias mais atuais, o que representa importante avanço ao possibilitar que o examinador determine com mais precisão os limites anterior e posterior da malha trabecular.

Além disso, o exame OCT de segmento anterior pode ser uma ferramenta útil na avaliação e seguimento não invasivo de diversas patologias da superfície ocular, atuando como uma espécie de “biópsia óptica” e auxiliando o especialista a caracterizar melhor lesões de caráter degenerativo, distrófico ou neoplásico. Como exemplo de doenças de superfície com características específicas ao SA-OCT, podemos citar: neoplasia escamosa, melanoma, nevo de conjuntiva, linfoma, amiloidose, pterígio, dentre outros.

A gama de aplicação do OCT de segmento anterior estende-se ainda para diversas outras situações clínicas. No contexto de ectasias corneanas como ceratocone, por exemplo, este exame pode fornecer detalhada caracterização da microarquitetura tecidual, auxiliando o seguimento da doença, e a avaliação de resultados após procedimentos como crosslinking. Vale ainda citar o recente trabalho de Edmund Tsui e colaboradores, publicado na American Journal of Ophthalmology, no qual os autores utilizaram o SA-OCT em crianças com uveíte anterior para quantificação de células na câmara anterior. Trata-se, pois, de uma ferramenta muito útil no diagnóstico e seguimento de inflamações intraoculares na população pediátrica, na qual muitas vezes o médico não dispõe da colaboração necessária por parte do paciente para que possa realizar biomicroscopia anterior detalhada.

Em suma, o SA-OCT veio para ajudar oftalmologistas na análise de diversos parâmetros importantes para o diagnóstico e acompanhamento de múltiplas doenças oftalmológicas. Com potencial de aplicação crescente conforme o avanço tecnológico é empreendido, faz-se necessário conhecermos suas indicações, para que possamos agregar cada vez mais eficácia ao processo diagnóstico e à abordagem clínica dos nossos pacientes.

Referências

1. Edmund Tsui et al. Quantification of Anterior Chamber Cells in Children With Uveitis Using Anterior Segment Optical Coherence Tomography. American Journal Of Ophthalmology. March 2022

2. Técnicas de imagem do segmento anterior na avaliação do ângulo da câmara anterior. e-Oftalmo.CBO: Rev. Dig. Oftalmol., São Paulo, 2016; 2

3. Maslin, Jessica S; Barkana, Yaniv1; Dorairaj, Syril K2,. Anterior segment imaging in glaucoma: An updated review. Indian Journal of Ophthalmology: August 2015 – Volume 63 – Issue 8 – p 630-640 doi: 10.4103/0301-4738.169787

4. Radhakrishnan, S., Goldsmith, J., Huang, D., Westphal, V., Dueker, D. K., Rollins, A. M., Izatt, J. A., & Smith, S. D. (2005). Comparison of optical coherence tomography and ultrasound biomicroscopy for detection of narrow anterior chamber angles. Archives of ophthalmology (Chicago, Ill. : 1960), 123(8), 1053–1059. https://doi.or

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