Tratamento do glaucoma: entenda como funciona

A base do tratamento do glaucoma primário de ângulo aberto é a redução da pressão intraocular (PIO) que pode ser atingida por meio de colírios hipotensores, cirurgias, implantes intraoculares e laserterapia. Entretanto, as drogas hipotensoras utilizadas por meio de colírios ainda constituem a base do tratamento. Existem diversas classes de medicamentos disponíveis no mercado e saber qual delas é adequada para o seu paciente, trará melhores resultados e aderência ao tratamento.

Qual é o melhor tratamento do glaucoma?

A droga ideal para o tratamento do glaucoma deve conter algumas características como: redução eficiente da PIO; nenhum ou poucos efeitos adversos; não exacerbar doenças sistêmicas; baixo custo; e posologia confortável. Sabemos, no entanto, que tal droga ideal não existe e que devemos ter conhecimento sobre o mecanismo de ação e contra-indicações dos principais medicamentos disponíveis, a fim de individualizar o tratamento para cada paciente com base em suas características e necessidades.

Confira, a seguir, outras opções de tratamento do glaucoma!

Bloqueadores beta-adrenérgicos

Essa classe de medicamentos atua reduzindo a produção de humor aquoso (HA) pelo corpo ciliar. Seus efeitos adversos decorrem de sua absorção sistêmica, e podem levar à bradicardia e broncoconstrição. Pacientes suscetíveis podem apresentar broncoespasmo, arritmias e hipotensão arterial.

Outros efeitos descritos na literatura médica e associados ao uso dessas medicações são: piora de sintomas de depressão e ansiedade, disfunção sexual, visão borrada, dor ocular e anestesia corneana. Uma medida que pode reduzir a absorção sistêmica é, após a instilação do colírio, realizar digitopressão durante 5 minutos sobre a região do saco lacrimal (canto interno das pálpebras, próximo à raiz nasal).

Os principais beta-bloqueadores disponíveis no Brasil para tratamento do glaucoma são:

• Timolol: beta bloqueador não-seletivo (inibe os receptores beta1 e beta2). Disponível na apresentação de 0.5%.

• Betaxolol: antagonista beta1 seletivo, apresentando menos efeitos colaterais sistêmicos. Entretanto, a redução da PIO é menor em relação às drogas não-seletivas.

Essa classe de medicamentos é contraindicada em pacientes asmáticos, com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), bradicardia sinusial, bloqueios de 2º e 3º graus, miastenia gravis e insuficiência cardíaca descompensada. Pacientes que já utilizam beta-bloqueadores orais têm maiores chances de eventos adversos.

Usuários de lentes de contato gelatinosas devem ser orientados a remover as lentes antes da aplicação do colírio, aguardando 15 minutos para colocá-las novamente pois o cloreto de benzalcônio, usado como conservante, pode ser absorvido pelo material da lente levando a maior chance de toxicidade ocular.

Deve-se considerar a troca de medicação em pacientes que serão submetidos a cirurgias de grande porte, pois existe o risco de hipotensão grave quando em vigência do uso de anestésicos. Nesse caso é importante lembrar que o tempo de washout dessas medicações pode levar entre 2 e 4 semanas.

Não existem estudos que garantam a segurança dessas medicações na lactação e gestação, devendo ser avaliado o risco-benefício de seu uso.

Inibidores da anidrase carbônica

Essa classe de medicamentos atua diminuindo a secreção de humor aquoso por meio da inibição da enzima anidrase carbônica (AC) presente no corpo ciliar. Muitos tecidos corpóreos, incluindo o olho, contém a enzima AC, responsável por catalisar a reação reversível de hidratação do dióxido de carbono e desidratação do ácido carbônico. Existem diversas isoenzimas da AC, sendo a AC-II responsável pelo controle da produção do humor aquoso. Além do epitélio ciliar, essa isoenzima também pode ser encontrada nos eritrócitos. A inibição da AC leva à redução da concentração de bicarbonato nos fluidos oculares diminuindo assim a secreção do humor aquoso.

Os medicamentos dessa classe estão disponíveis para administração sistêmica ou tópica sob a forma de colírio. Quando utilizadas por via oral, apresentam maiores taxas de redução da PIO. Esse efeito

ocorre em parte pela redução de bicarbonato no vítreo, contribuindo assim para a redução do seu volume e também devido a ocorrência de relativa acidose metabólica.

As reações adversas associadas a essa classe medicamentosa tendem a ser menores, apresentando melhor aceitação pelos pacientes. Os sinais e sintomas frequentemente descritos em relação ao uso dessas medicações são: ceratite, acidose, parestesia, anorexia, náusea, depressão e dispepsia.

Dorzolamida

A dorzolamida é uma droga utilizada sob a forma de colírio a 2%. É geralmente prescrita a cada 12 horas, podendo ser também instilada a cada 8 horas. Os principais efeitos adversos são sensação de queimação ocular, gosto amargo na boca, ceratite superficial e alergia.

Essa medicação é contraindicada em pacientes com insuficiência renal e clearance de creatinina (ClCr) inferior a 30 mL/min e também em pacientes hepatopatas ou com anemia falciforme. Por serem derivadas quimicamente das sulfas, apresentam risco potencial de efeitos adversos similares às medicações sistêmicas dessa classe como, por exemplo, síndrome de Stevens-Johnson e discrasias sanguíneas.

Além disso, a inibição da anidrase carbônica no endotélio corneano pode levar ao aumento do edema de córnea em pacientes com baixa contagem endotelial. Seu uso também não é indicado quando o paciente está em tratamento com inibidores de anidrase carbônica sistêmicos.

Brinzolamida

Disponível como colírio na concentração de 1%, também pode ser aplicada a cada 12 ou 8 horas. Apresenta menos efeitos adversos em relação à dorzolamida e os eventos relatados com maior frequência são: visão borrada, gosto amargo, blefarite, dermatite, olho seco, sensação de corpo estranho ocular, cefaleia, hiperemia ocular, dor e prurido.

Assim como a dorzolamida, não deve ser utilizada em pacientes com insuficiência renal com clerance de creatinina abaixo de 30 mL/min e em pacientes com baixa contagem endotelial.

Acetazolamida

Essa medicação é administrada por via oral. Além de sua ação oftalmológica diminuindo a produção do HA e reduzindo o volume vítreo, apresenta ação sistêmica atuando em outros órgãos do corpo. Nos túbulos renais, por exemplo, causa alcalinização da urina pela diminuição da reabsorção do bicarbonato. Consequentemente, há retenção de prótons (íons H+) no plasma, gerando tendência à acidose metabólica. Além do bicarbonato, aumenta-se a excreção de sódio, de potássio e de água (efeito diurético).

Para que haja redução da PIO, cerca de 90% da enzima AC deve estar inibida. Os efeitos geralmente iniciam a partir de 1h após a administração, com pico de ação após 4 horas e duração do efeito por 12 horas. A posologia indicada é 250mg 4 vezes ao dia ou 500mg 2 vezes ao dia para comprimidos de liberação prolongada.

A dosagem da acetazolamida deve ser ajustada de acordo com o clearance de creatinina dos pacientes:

– ClCr 10-50 mL/min: administração de 250mg 12/12h;

– ClCr < 10 ml/min: não utilizar;

– Paciente em hemodiálise: cerca de 20-50% é dialisável;

– Diálise peritoneal: Não é necessário ajuste de dose.

Os efeitos adversos mais comuns são confusão mental, convulsão, parestesia e diarreia. Essa medicação é contraindicada em pacientes com hipocalemia, hiponatremia, acidose hiperclorêmica, hipersensibilidade a acetazolamida ou sulfa, doença hepática, doença renal grave, cirrose hepática, anemia falciforme. Também não é recomendada para uso durante gestação (categoria C) e lactação.

Neste artigo foram apresentadas as características de duas classes de medicamentos comumente utilizadas no tratamento do glaucoma. Espero que tenha sido útil. Não deixe de conferir o texto abordando as demais classes (alfa2-agonistas e análogos de prostaglandina). Nos vemos por lá!