Conjuntivite Alérgica: Classificações, Fisiopatologia, Aspectos Clínicos e Tratamento

Entre os principais sintomas da conjuntivite alérgica, podem-se destacar: acometimento de ambos os olhos, sensação de corpo estranho ou areia nos olhos, lacrimejamento com secreção de aspecto seroso ou mucoide, hiperemia conjuntival, quemose, reação papilar em conjuntiva tarsal e hiperemia e edema palpebral.

Os sintomas podem ser divididos em precoces ou tardios, sendo os primeiros relacionados à liberação de histamina, e incluem lacrimejamento, prurido, hiperemia e edema. Os sintomas tardios, por sua vez, são relacionados à infiltração do epitélio por linfócitos, neutrófilos, basófilos e eosinófilos algumas horas após o início do quadro clínico. Essa inflamação tardia leva a um estado de cronicidade e o paciente pode experimentar sintomas como fotofobia, dor ocular, embaçamento visual, e presença de secreção. 

Quer saber mais? A seguir, você confere a classificação da conjuntivite alérgica, sintomas, causas, entre outros assuntos.

Boa leitura!

Quais são as classificações da conjuntivite alérgica?

A classificação de conjuntivite alérgica engloba a alergia ocular e as hipersensibilidades oculares não-alérgicas. O primeiro grupo pode ser mediado por Imunoglobulina E (IgE) ou por outros mecanismos não-IgE. Dentre as alergias oculares mediadas por IgE temos: conjuntivite alérgica sazonal, conjuntivite alérgica perene, ceratoconjuntivite vernal e ceratoconjuntivite atópica. Dentre as não-IgE temos, blefaroconjuntivite de contato, ceratoconjuntivite vernal e ceratoconjuntivite atópica. 

Nesta reação, quando o antígeno atinge a conjuntiva, ocorre a liberação de células Th2 que estimulam a produção de imunoglobulinas E (IgE) e que, por sua vez, se ligam às membranas de basófilos e mastócitos, levando à liberação de substâncias vasoativas e citotóxicas, sendo uma delas a histamina. A histamina se liga a receptores H1 e H2; os primeiros estão presentes em terminações nervosas e relacionam-se aos sintomas de prurido, já os segundos estão presentes nas paredes dos vasos, levando a vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular e quemose. 

Prostaglandinas e leucotrienos também são liberados nesse processo, e a prostaglandina PGD2 é a responsável pela quemose, hiperemia, dor e infiltração eosinofílica, enquanto o leucotrieno LTB4 produz quimiotaxia para mais eosiófilos e também neutrófilos. Outras substâncias liberadas nesse processo e que também atuam na quimiotaxia de leucócitos são o fator de ativação plaquetária e o fator quimiotático de eosinófilos. A conjuntivite alérgica pode ainda estar relacionada a condições infecciosas como, por exemplo, a infecção pela Chlamydia trachomatis e outras bactérias, além de vírus. Por exemplo, Ehlers e Donshik (1992), descreveram maior frequência de infecções oculares pelo vírus herpes simples em pacientes com ceratoconjuntivite atópica. 

Conjuntivite alérgica sazonal e perene 

Cerca de 95% dos casos de conjuntivite alérgica são causados pelas conjuntivite alérgica sazonal e/ou perene. Acometem crianças, adolescentes, e adultos jovens, sem distinção entre gênero. Geralmente, os pacientes apresentam história de atopia, rinite e asma. Ocorre por mecanismo de hipersensibilidade do tipo I, mediado por IgE. 

A forma sazonal caracteriza-se por um quadro de instalação súbita, geralmente no período do outono e primavera e está relacionada à presença de antígenos sazonais, como o pólen; um sintoma muito comum entre os pacientes é a quemose, que tende a ser bilateral. Já a forma perene, também bilateral, apresenta caráter crônico, com períodos de exacerbação e remissão, relacionado à presença de antígenos perenes como ácaros e poeira. Nesses pacientes é comum a observação de papilas pequenas, menores que 1mm e que predominam na conjuntiva tarsal superior. Além disso, raramente ocorre acometimento corneano. 

Os principais diagnósticos diferenciais são olho seco, blefarite, rosácea ocular, toxicidade pelo uso de colírios e disfunção das glândulas de Meibomius. Para confirmar o diagnóstico é importante identificar quais os alérgenos causadores, a fim de evitar a exposição. Por exemplo, paciente que são alérgicos ao pólen, podem iniciar o tratamento antes do período em que ocorre a liberação do pólen no ambiente. 

Ceratoconjuntivite vernal 

É uma doença inflamatória crônica, bilateral que acomete a conjuntiva limbar e tarsal superior. Ocorre frequentemente em indivíduos do sexo masculino, jovens – em idade pré-escolar e pré-puberal — que residem em regiões de clima tropical, porém existem casos descritos em pessoas que moram em locais de clima frio. 

É uma condição que apresenta certa sazonalidade, sendo mais frequente ao final da primavera e verão, o que indica relação com presença de pólen no ar. A ceratoconjuntivite vernal é causada por reação de hipersensibilidade do tipo 1 (dependente de IgE) e tipo 4 – que não depende de IgE. Nos indivíduos acometidos observa-se aumento de linfócitos T CD4+, principalmente Th2. 

Estudos observaram que existe uma relação entre a doença e a deficiência de imunoglobulinas e de vitamina D, além de uma relação estreita com outras doenças atópicas. 

Raspados de conjuntiva evidenciam aumento de infiltração por eosinófilos, mastócitos e interleucinas do tipo 6 e 8 (IL-6 e IL-8). Acredita-se também que existam fatores endócrinos e genéticos envolvidos na fisiopatologia, pois a doença acomete mais homens e existe relação com historia familiar e etnia, sendo mais frequente em europeus, americanos e africanos. 

Os pacientes geralmente apresentam sintomas como prurido intenso, hiperemia conjuntiva, secreção mucosa ou aquosa, fotofobia, sensação de corpo estranho, porém não há acometimento palpebral, o que auxilia na diferenciação com outras formas de conjuntivite alérgica. 

Foram descritas três formas da doença: tarsal, limbar e mista. A forma tarsal cursa com papilas gigantes (>1mm), com padrão em pedra de calçamento (cobblestone-like), envoltas por filamentos de muco. Já a forma limbar apresenta nódulos limbares formados por infiltrados linfocíticos e os nódulos de Horner-Trantas, sendo esses últimos indicadores de atividade de doença. A forma mista apresenta tanto os infiltrados limbares quanto as papilas tarsais. A presença das papilas gigantes pode levar à formação de alterações corneanas, como ceratite e úlcera em escudo, culminando em ambliopia, ceratocone, e deficiência de células-tronco limbares. 

Conjuntivite atópica 

É a forma mais grave dentre as conjuntivites alérgicas, sendo considerada como a manifestação ocular da dermatite atópica. Apresenta-se como uma ceratoconjuntivite crônica inflamatória bilateral que acomete a superfície ocular e pálpebras e apresenta elevado potencial para sequelas. 

Acomete preferencialmente indivíduos do sexo masculino, com pico de incidência entre 20 a 50 anos de idade. Geralmente os pacientes apresentam história familiar de dermatite atópica e outras alergias como eczema, asma e/ou urticária. É mediada principalmente por reação de hipersensibilidade do tipo 4, com predominância de células T, especialmente Th1 e eosinófilos. Alguns estudos evidenciam que em alguns casos há participação de hipersensibilidade do tipo 1, mediada por IgE e também participação de colonização de pálpebras e conjuntivas por Staphylococcus aureus. 

As manifestações clinicas da conjuntivite atópica são eczema de pálpebras, prurido, hiperemia conjuntival, quemose, papilas tarsais, principalmente na conjuntiva inferior, nódulos de Horner-Trantas (em fases ativas da doença). Em fases crônicas é possível avaliar hiperpigmentação e queratinização palpebral, linhas de Dennie-Morgan, madarose, tilose, deformidades palpebrais, simbléfaro, ptose, úlceras corneanas, ceratite e pannus. Esses sintomas tendem a piorar durante o inverno ou então em locais de clima frio. 

Blefaroconjuntivite de contato 

É uma reação causada por contato com alérgenos onde o paciente desenvolve uma inflamação aguda e intensa na pele das pálpebras e conjuntiva, cursando com hiperemia, queimação, prurido e descarga aquosa. A reação alérgica pode levar dias após o primeiro contato com a substância alergênica, porém outros contatos podem levar a uma reação mais rápida. O mecanismo é a reação de hipersensibilidade do tipo 4, mediada por linfócitos Th1 e Th2. 

Como é feito o diagnóstico das conjuntivites alérgicas? 

Para se chegar ao diagnostico é importante uma anamnese e exame de vista. Além disso, é necessário identificar os alérgenos aos quais o paciente é alérgico. Para esse fim, podem ser realizados prick test ou patch test. Caso esses sejam inconclusivos ou haja a necessidade de confirmação, pode-se lançar mão da dosagem de IgE para aeroalérgenos e até mesmo teste de provocação para alérgenos conjuntivais. 

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Como tratar conjuntivite alérgica?

O principal item do tratamento das conjuntivites alérgicas é a retirada do contato com o alérgeno que dispara a reação alérgica. Entretanto, em alguns casos, é difícil retirar completamente o contato com o alérgeno. Dentre as medidas não farmacológicas, pode-se lançar mão de compressas frias, colírios lubrificantes gelados que visam aliviar os sintomas e diluir a concentração de alérgenos. 

O tratamento farmacológico envolve o uso de anti-histamínicos tópicos e orais. No entanto, o uso de anti-histamínicos orais podem reduzir a quantidade de lágrima induzindo sintomas de olho seco piorando o quadro alérgico. Em relação aos colírios, o ideal é utilizar fórmulas livres de conservantes. 

Os estabilizadores de membrana dos mastócitos inibem sua degranulação e são usados como profilaxia, por um período de, no mínimo, duas semanas. As principais drogas com esse mecanismo de ação são: cromoglicato dissódico, nedocromil sódico, lodoxamina e pemirolast. Os agentes duais, são considerados primeira linha terapêutica e atuam inibindo os receptores H1 e a degranulação de mastócitos. Incluem a bepotastina, epinastina, azelastina, alcaftadina e cetotifeno e olopatadina, sendo esse último o único aprovado para tratamento de todos os sintomas oculares. 

Agentes antiinflamatórios não-esteroidais são pouco utilizados na pratica clínica e apesar de melhorarem o prurido, muitos pacientes referem sensação dolorosa ao instilar o colírio. O uso de inibidores de leucotrieno como o montelucaste oral, pode ser utilizado como adjuvante ao tratamento. Os corticoides são amplamente utilizados principalmente em formas mais graves e intensas, entretanto, os pacientes em uso dessa classe de medicamentos devem ser monitorados com frequência devido ao risco de eventos adversos. O uso dos corticoides no contexto das alergias oculares deve ser em um curso rápido de 3 a 5 dias e sempre associado aos anti-histamínicos. 

Nos casos mais graves, com pouca resposta às outras classes de medicamentos ou então com necessidade de uso frequente de corticosteroides, devemos avaliar a necessidade de uso de imunomoduladores, como ciclosporina e tacrolimus. Essas drogas, chamadas inibidores da calcineurina, atuam inibindo os receptores de IL-2 presentes no linfócito T. O omalizumabe é um anticorpo monoclonal humanizado anti-IgE que liga-se à IgE livre circulante e também àquelas presentes em membranas de linfócitos B, controlando o processo inflamatório mediado por hipersensibilidade do tipo I 

Conclusão 

As alergias oculares são um grande e complexo grupo de doenças e que devem ser adequadamente classificadas a fim que de o tratamento correto seja adotado. Existem diversos tratamentos disponíveis atualmente no mercado, porém as medidas de controle ambiental são muito importantes para o controle da doença a longo prazo. Esses pacientes precisam de avaliações constantes, a fim de mitigar possíveis complicações, como úlceras de córnea, infecções e até mesmo o ceratocone, em pacientes predispostos. 

Referências 

1. Ehlers WH, Donshik PC. Allergic ocular disorders: a spectrum of diseases. CLAO J. 1992;18(2):117-24. 

2. Stoppel OJ. Alergia ocular. Revista Médica Clínica Las Condes, 2010; 21 (6): 875-882. 

3. Sandrin LNA, Santo RM. Perspectivas no tratamento da alergia ocular: revisão das principais estratégias terapêuticas. Rev. Bras. Oftalmol. 74 (5), 2015 

4. Villegas BV, Benitez-del-Castillo. Current knowledge in allergic conjuntivites. Turk J Ophthalmol. 2021; 51:45-54 

5. Rosario CS et al. Entendendo a alergia ocular. Arq Asma Alerg Imunol. 2020; 4(1): 78-